Ela sempre se incomodara com as diferenças, não suportava quem pensasse de outra forma, se vestisse fora de seus padrões, vivesse segundo outros princípios, gostasse do que ela não gostasse... Ainda relutando em abrir os olhos e encarar a luz que insistia em entrar pela janela e anunciar que mais um árduo dia chegara, ela notou que o ar ao seu redor mudara, e gostou daquilo. Abrindo definitivamente os olhos viu tudo como sempre sonhou em ver ao acordar em uma Segunda-Feira de manhã. Tudo perfeitamente no lugar, ao seu alcance, agilizando sua saída para o trabalho, nada perdido, nada esquecido, café pronto...
Ao olhar o espelho viu-se pronta, fios de cabelo no lugar, sem batom no dente, sem manchinha no blazer, era a hora de encarar o mundo lá fora. Pela primeira vez, ver tudo diferente não a incomodou, as diferenças seguiam alegremente seu padrão, todos os carros no estacionamento eram da mesma marca, modelo e cor que ela adorava, e se ela já não soubesse qual era sua vaga seria difícil distinguir qual era o seu, sua saída ao trabalho lhe parecia um passeio, tudo era lindo aos seus olhos, as pessoas se vestiam bem, andavam na velocidade certa, acompanhados pelas pessoas certas, as casas não tinham mais aquelas cores horríveis de mal gosto, eram todas iguais. Todos os escritórios que tratavam de negócios imobiliários pareciam com aquele para o qual ela não tivera competência para ser admitida, dessa forma, aquele onde ela trabalhava agora, finalmente, era o emprego dos sonhos. Antes de entrar em sua sala reparou que todos usavam o mesmo delicioso perfume, que ela amava, pois lembrava seu pai, notou ainda que todas as colegas de trabalho haviam optado por trajes bem semelhantes aos dela, nos mesmos tons pastéis, que aliás, também estavam nas paredes internas do prédio. Os homens vestiam-se com ternos pretos, com camisas brancas e gravatas discretas, talvez todos usassem a mesma cor de gravata.
Uma sensação estranha a percorria, algo como o que se sente quando se está sendo perseguido, e bom, de certa forma, era assim que ela se sentia ao ver que de uma hora pra outra todos eram cópias dela mesma, todos comentavam sobre os mesmos livros e ouviam as mesmas músicas que ela, os filmes em cartaz eram todos de seu gênero favorito, nenhuma comédia com adolescentes falando de/fazendo sexo, nem os jovens gostavam mais desse tipo de filme, eram espertos demais pra isso. Isso incomodava cada vez mais, seus pensamentos considerados únicos e originais agora eram senso comum, sua identidade já não existia mais, pois todos tinham a mesma identidade, no meio de tudo ela era só mais uma, jamais seria notada pois era igual a todos os outros, que também nunca seriam notados, pois ninguém tinha menos ou mais talento.
Lutar para ser alguém melhor acabou por perder o sentido, pois não importa o que se fizesse todos morriam como nasciam, nem melhores, nem piores, então ela desistiu de fazer o bem, mas também não conseguia fazer o mal, pois nesse novo mundo perfeito aos seus olhos o mal não existia. Era cansativo viver daquela forma, comendo todos os dias o seu prato preferido porque simplesmente era o que todos comiam, não havia mais nada no cardápio, ela queria vestir uma camiseta confortável para fazer uma caminhada, mas tal peça já não existia mais por não ter suficiente elegância, seu mundo perfeito virara um inferno. A mesma radio, o mesmo site, o mesmo canal... tudo se repetia, todos os dias, ela queria fugir da rotina, dançar a noite toda enchendo a cara de vodca como há muito não fazia, mas ali ninguém se divertia dessa forma, pois esse tipo de vida não levava ninguém à lugar nenhum. Agora chorar à noite era uma rotina bem maior, pois passou a sentir falta dos amigos que afastou por viverem uma vida menos regrada que a dela, se arrependeu de cada vez que julgou um comportamento alheio que ela "nunca teria", queria todas as diferenças do mundo de volta, queria voltar a ser única no mundo, era frustrante ser igual a todos... só agora ela percebia... tarde demais.
Lutar para ser alguém melhor acabou por perder o sentido, pois não importa o que se fizesse todos morriam como nasciam, nem melhores, nem piores, então ela desistiu de fazer o bem, mas também não conseguia fazer o mal, pois nesse novo mundo perfeito aos seus olhos o mal não existia. Era cansativo viver daquela forma, comendo todos os dias o seu prato preferido porque simplesmente era o que todos comiam, não havia mais nada no cardápio, ela queria vestir uma camiseta confortável para fazer uma caminhada, mas tal peça já não existia mais por não ter suficiente elegância, seu mundo perfeito virara um inferno. A mesma radio, o mesmo site, o mesmo canal... tudo se repetia, todos os dias, ela queria fugir da rotina, dançar a noite toda enchendo a cara de vodca como há muito não fazia, mas ali ninguém se divertia dessa forma, pois esse tipo de vida não levava ninguém à lugar nenhum. Agora chorar à noite era uma rotina bem maior, pois passou a sentir falta dos amigos que afastou por viverem uma vida menos regrada que a dela, se arrependeu de cada vez que julgou um comportamento alheio que ela "nunca teria", queria todas as diferenças do mundo de volta, queria voltar a ser única no mundo, era frustrante ser igual a todos... só agora ela percebia... tarde demais.
Não, ainda não era tarde demais, ainda havia uma saída, ela ainda podia... acordar.
"Que bom que foi só um longo sonho."
Agora era bom ver que não tinha tempo de manter seu quarto tão arrumado quanto gostaria, que sairia com sua pior roupa, que seu carro era velho, que o transito era um caos e as pessoas eram mal educadas e tinham mal gosto. Finalmente ela tinha respeito por tudo isso, tudo o que significava que as pessoas eram diferentes entre si, seus valores haviam se modificado...
"Que tal ligar pra aquela amiga vadia que não quer nada com a vida?"
10 comentários:
Muito bacana o texto. Apesar do mudo idealizado pela personagem que para ela é um mundo diferente e ideal, eu acho meio monotono,padronizado, falta diversidade. Acho que o brilho do mundo ideal ou não é a diferença. mas, enfim, cada idealiza o mundo que quer. No mais o texto é muito bom.
abraço,
www.todososouvidos.blogspot.com
devia estar bem inspirada pra fazer um texto desse é um texto grande e bom.
É Ítalo, a ideia é mostrar que a personagem peca em achar que tudo deve ser padronizado
E é por isso que achei o texto interessante, porque há uma crítica que a gente pode fazer nas entrellinhas.
Abraço!
"Que bom que foi só um longo sonho." Fato
texto muito bom memso =]
sei que quando a gente escreve não pensa mto no tamanho do texto, mas como dica aconselho você a diminuir um pouco, galera num gosta muito de ler, infelizmente
Muito bacana o blog e as publicações. Parabéns!
S.Rïver
http://saimonrio.blogspot.com
http://www.facebook.com/saimonrio
Olá Raquel, interessante o seu conto, onde a personagem central idealiza um mundo que em princípio ela acredita ser o ideal, na prática ela acaba por sofrer com as consequências ruins que isso gerou, demonstrando que ela estava equivocada. Você está de parabéns Raquel! Primeiro pelo ótimo intuito do texto, e segundo devido a maneira que escreve, que é muito boa!
Obrigado pela visita...
Anselmo
http://brevescronicas.blogspot.com.br
Adorei o texto, crônica misturada com pensamento... muito legal.
Tenho alguns assim também pelas minhas páginas.
Aproveitando que estou num blog literário, aproveito para oferecer parceria. Caso esteja interessada, podemos trocar links.
Conheça um de meus blogs.
Abraços!!!
www.olharemnegativo.blogspot.com
www.redutonegativo.blogspot.com
Bela escolha de fotos, além do texto ser super forte!
Beijos,
Gabriel
http://desejosdesabado.blogspot.com.br/
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